Nunca vi os animais como
seres menos que os humanos em todas as questão, principalmente no que diz sobre inteligência.
Mesmo porque essa palavra é muito relativa.
E também não vou ficar buscando
exemplos que comprovem a sabedoria deles; quem tem bicho perto de si sabe que
eles estão aqui para nos ajudar nessa trajetória deste planeta denso, intenso.
Já tive muito bicho. Desde pequena
não sei o que é viver sem eles. Era gato, cachorro, porquinho-da-índia (alguém
já viu?), pintinho, marreco, coelho, e lá se vão. Até comida pra rato eu já dei
(rato mesmo, daqueles tipo de esgoto).
Só não dava certo passarinho; no
dia seguinte eu abria a gaiola e ficava esperando ele sair.
Alguém já soltou passarinho da
gaiola?
Eu já soltei um monte. Meu, da
vizinha, da lavadeira, do meu vô.
Tudo começou quando eu ganhei um canário. Ganhei do meu padrasto (homem do
bem).
“Não vai soltar ele, custou muito
caro. Ganhei no pagamento de uma dívida.”.
Eu, com nove anos, no meu corpo
franzino, de joelho torto e cabelo ralo, recebi a gaiola nas mãos de unhas
sujas e maltratadas (não dá tempo de se embelezar quando você tem uma ninhada
de gato sem mãe-gata pra cuidar).
“Não pode soltá-lo, senão ele
morre de fome, tá?”, afirmou meu padrasto.
Soltar passarinho da gaiola traz
felicidade morna, quase beirando a melancolia.
No primeiro instante, ele não
sabe o que fazer. Fica lá esperando alguma coisa (comida, troca de água,
limpeza). De repente, ele olha para a portinha aberta, faz aqueles movimentos
rápidos com a cabeça... e espera. Dependendo do tempo de gaiola, tem passarinho
que nem sai, não sabe mais voar.
Tem tristeza maior que essa?
Um passarinho que não sabe voar?
Ele demorou, se aquietou, depois se
desassossegou de novo, foi lá dá uma espiada no mundo dividido e ... voou.
“Mãe, não tem o passarinho que vocês
me deram...”
“Tem”, ela respondeu.
“ Ele fugiu...”
“Fugiu como?”, com a voz curiosa.
“Não sei, quando eu voltei ele
não tava mais na gaiola”, contei.
Uma pausa nos lábios da minha mãe.
Depois de um tempinho ela pergunta:
“O voo foi bonito?”
“Foi”, respondi.
Ela sorri.
Que todos os seres sejam felizes
Que todos os seres sejam livres
Budismo Tibetano