(re)aprendendo a amar


Numa enxurrada de imagens, livros, atitudes e dicas, hoje em dia a mulher se encontra num triste dilema: entre se amar e amar seu parceiro. 
No meio de tantas terapias, que ensinam a você se amar em primeiro lugar (realmente isso é necessário) parece que se esquecem de falar que amar é algo inerente ao ser humano, que estamos aqui para isso.
Você precisa se amar para amar. E é isso! Simples assim.
Mas siga até o final da frase: Ame!

Outro dia ouvi de uma amiga que mencionava aterrorizada a cena que viu uma das suas amigas fazer, “nossa, ela serviu o prato do marido primeiro, isso é inaceitável”. 
A bolacha que então passeava pela minha boca não desceu, empurrei-a com força e saiu uma voz sumida, “eu às vezes faço isso...”, admiti.

Durante quase dois anos, fui mediadora de um Círculo de Mulheres, e estas que eu estava conversando neste momento faziam parte do meu círculo.
Então vocês imaginam qual foi a surpresa quando a sentença “eu faço isso” saiu das minha entranhas, mesmo que tímida.

E elas imediatamente se consertaram!
“Sim, sim, é normal, mas certamente é quando a mulher faz isso sem ser obrigação.” Os olhos das duas pausaram na xícara do café.

Mas seria diferente?
Eu sei que muitas mulheres fazem por isso obrigação. Ainda há muitas que “servem” (leiam também no sentido amplo da palavra) o marido, ainda banhadas pela tradição machista que perdura até hoje. 
Mas isso não quer dizer que tenhamos que levantar uma bandeira e queimarmos os nossos panos de prato e endurecer nossos corações.
Precisamos sim é (re)aprender a amar, sem que isso nos cause dor e humilhação (mesmo porque não há coesão entre estes “sentimentos” com o  amor).

Amar tem isso sim de ser gentil e entregue. Tudo que é feito com amor vira “o servir” um gesto de carinho e cuidado.

Se não me fiz entender, peço desculpas pela minha falta de jeito com as palavras.
Mas trago a cadência poética de Adélia Prado para sustentar o que quero dizer.

Com vocês, o poema em ritmo de entrega da minha amada Poetisa:


Casamento

Há mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque,
mas que limpe os peixes.
Eu não. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como “este foi difícil”
“prateou no ar dando rabanadas”
e faz o gesto com a mão.
O silêncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.


                       Adélia Prado


E é isso!

Beijo literalmente amorosos